Psicóloga do CRAS escreve sobre Setembro Amarelo

Paz com voz!

A música “Minha Alma” da Banda O Rappa traz especificamente um fragmento que diz: “ paz sem voz, não é paz é medo” que pode remeter às muitas falas de pessoas que passaram ou estão passando por processos de depressão, de pessoas que cometeram suicídio ou das que pensam em atentar contra a própria vida. A paz sem voz, o calar, o não “des-abafar” são fatores geradores dos mais profundos sofrimentos, àqueles que fazem ruir a alma, gerando efeitos psicossomáticos (quando o corpo (soma) adoece pagando pelo que a mente (psico) não suporta). Surgem então os sintomas, medos, angústias, ansiedades que, com o passar do tempo, potencializam e se tornam doenças.

O cansaço existencial gerado por todos esses sintomas pode  levar o ser humano a procurar o alívio imediato, o descanso para esse sofrer. O ideal suicida está atrelado mais à vontade de descansar do que a vontade de morrer, de perder ou de tirar a vida. O cansaço existencial é diferente da doença depressão, embora os sintomas sejam bem parecidos! A própria vida o ânimo não existe para a pessoa que está em depressão, enquanto o cansaço por si só já define o sintoma de desânimo.

Todos nós passamos por momentos difíceis e vivenciamos situações que nos levam a pensar que não conseguiremos resolvê-los, esse mal-estar causado pelos problemas mal resolvidos vem sendo chamado equivocadamente de depressão. Não pretendo abordar essas diferenças porque é tema muito debatido, mas gostaria de destacar que as palavras: depressão, ansiedade, pânico estão muito em voga e vêm sendo usadas equivocadamente, para nominar tudo hoje em dia, isso merece atenção e cuidado! Tem que haver critério, diagnóstico profissional especializado para conceituar e para tratar.

Acompreensão do que nos move diariamente, exige uma reflexão e prática da busca de respostas encontradas na consciência de si. Qual o propósito de cada um? Penso que o nosso propósito seja encontrar a felicidade, que no final das contas está muito associada à construção da nossa paz, não existe felicidade sem paz, sem paz de espírito, sem paz da alma, sem paz do corpo, sem paz nas relações. Tudo que nos inquieta, nos irrita, nos assusta, nos amedronta, tira nossa paz e, por consequência, nossa felicidade.

A música ‘’Minha Alma’’ nos provoca à reflexão sobre nossas escolhas e a projeção que fazemos no outro da felicidade que devemos construir a partir da consciência sobre nós mesmos, somada e não comparada e competida com a dos outros.  Convida-nos à reflexão sobre o “tempo” de cada um, a maturidade, o querer romper o ciclo do sofrimento. Não se trata de desrespeitar o sentir, nem de desconsiderar a realidade da dor e do sofrer alheio que sim, são fatos, mas de considerar que é possível ressignificar, dar outro sentido aos processos dolorosos, transformando-os, em vez de alimentá-los.

Nesse processo, se faz necessário ir ao encontro do perdão, da empatia, da consciência… do outro? Não! Antes de tudo de nós mesmos para conosco.  Muito comum se ouvir dizer que “não é tão simples assim”, outro fato! But…( como brinca uma amiga) mas…, a vida não permite reprise, não faz bis, é preciosa se observada e aproveitada em cada simples detalhe. Propósito? Amar, permitindo fluir no positivo os pensamentos, ações, sentimentos, construindo a paz no exercício do falar. A angústia se desfaz no “des- abafo”,  no enfrentamento e quebrantando o medo, d ansiedade, a insegurança, na busca da consciência e resolução do que os provoca.

Para tanto, como humanos, temos o privilégio de sermos dependentes, só existimos a partir do outro e, é nesse outro, que podemos encontrar suporte. A paz com voz, não abafada, calada, tolhida, castrada, mas expressa sem pudor no suporte do acolhimento do profissional, do amigo, do familiar, do pastor, do padre, do guru, de todo àquele que se dispõe ao que necessita desse amor de coração aberto, predisposto. Não se trata de alimentar uma zona de conforto, do comodismo (doloroso) da queixa, do resmungo, mas da evolução, do que escolhe se libertar das amarras do sofrimento e não tem forças para fazê-lo sozinho, oferecendo a oportunidade de se exercitar empatia, humanidade lembrando que  nos fortalecemos uns nos outros, reforçando o universo do bem, do que é bom, do que é leve, do que é agradável . “Ás vezes eu falo com a vida, às vezes é ela quem diz, qual a paz que eu não quero conservar pra tentar ser feliz…” que possamos exercitar a vontade de viver e conviver na alegria da existência e não mais remar no cansaço existencial que leva tantos à desistência.                                                               

                                                                                Cíntya Dutra Post

                                                                                    CRP12/ 06450                                                                                                                                                                                   Psicóloga CRAS SMBV